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“E elas chegaram”, por Werney Serafini

Falo das mutucas que chegaram em profusão! Para quem não conhece é um bichinho alado, pouco maior que uma mosca. Irrequieto, persistente, ávido por sangue, inclusive o humano que extrai com uma ferroada doída e ardida, semelhante a um beliscão. Isso sem falar na coceira e no inchaço na pele.

Aparece não se sabe como e nem de onde, em meados de outubro e intensamente em novembro. Desaparece em dezembro, no dia da Santa Luzia, segundo a crença popular.

André de Meijer, naturalista holandês que vive há vários anos no litoral do Paraná, dá algumas dicas sobre esse incômodo personagem.

Diz que na época das mutucas, ao andar pela mata, não se deve esquecer o chapéu. Não só para proteção solar, mas das mutucas. E não pode ser boné, pois elas vêm na cabeça e descem até as orelhas.

Surgem aos poucos no final da primavera. Primeiro uma pequena, depois outra maior e, na sequência, a maioria das espécies até atingir o ápice em novembro. Segundo ele, 28 espécies de 16 gêneros ocorrem nas planícies litorâneas.

Os machos preferem néctar e pólen das flores. São as fêmeas que sugam os humanos e outros mamíferos, porque após copularem, precisam de proteína animal para a maturação dos ovos.

 Acredita-se que surgem nas folhas do araçá (Psidium cattleianum). O naturalista esclarece que os ovos são depositados em camadas nas folhagens, galhos e na vegetação aquática acima da água ou da terra umedecida.

Localizam as vítimas, mamíferos e raramente aves, quando esses, em movimento, exalam dióxido de carbono, um atrativo poderoso, sensível ao olfato das mutucas. Sob alta luminosidade e elevada temperatura, incomodam do nascer ao escurecer. E não adianta prevenir, pois não existem repelentes que as afastem. À noite, felizmente, sossegam.

As cores escuras as atraem. Nos dias ensolarados e quentes levam à loucura bovinos, equinos e cães, principalmente os de pelagem escura e lisa. Os búfalos, para se protegerem, buscam refúgio nas lagoas lamacentas que, ao secar, deixa o corpo mais claro com uma camada protetora de argila cinza. Mesmo assim, não se livram do martírio, pois concentram o ataque nas orelhas, mantidas em constante movimento para afugentá-las.

Seus predadores são algumas vespas que parasitam os ovos e larvas que são consumidas pela garça-vaqueira (Bubulcis íbis) e pelo conhecido quero-quero (Vanellus chilensis).

Nas áreas urbanas não são muitas, talvez por existirem poucos animais de grande porte, seus preferidos. Em Itapoá, estão presentes, pois aqui, até na beira do mar, uma ou outra cumpre a sua sina sanguinária.

Interessante é a analogia com a Santa dos olhos. Meijer conta que ao observar com lente de aumento os olhos da mutuca, teve uma revelação surpreendente. Indeiscentes e verdes resplendem uma cor azul-violeta deslumbrante. Talvez por essa razão, os católicos do litoral atribuem o seu desaparecimento no dia 13 de dezembro, na festa de Luzia, a linda Santa protetora dos olhos.

Itapoá, (verão), dezembro de 2024.

Werney Serafini é presidente da Adea – Associação de Defesa e Educação Ambiental. Acredita no desenvolvimento de Itapoá com a observância de critérios ambientalmente adequados.

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