“Dois lados da mesma moeda”, por Fátima Rigoni

Eram duas mulheres, dois olhos, vários olhares. Uma bem mais centrada e equilibrada até parecia mãe da outra, que mesmo na madura idade, parecia adolescente. Os erros cometidos por ela sempre eram analisados meticulosamente pela mais, digamos assim, séria.

Uma mais cinza e a outra mais colorida. Pareciam adversárias, mas não… Eram apenas duas mulheres em um mesmo corpo em permanente análise e construção. A mais colorida gostava de dançar, expressar sentimentos e sensualidade através de movimentos corporais, enquanto ouvia os acordes, a intensidade e o ritmo da música. Era uma artista! As pessoas a olhavam, umas criticavam e outras contemplavam. Ela não se importava com o “dito” e o “não dito”. O importante era usufruir daquele momento, que para ela era atemporal e mágico. Excelente comunicadora, falava o que pensava e assim também agia.

Em seguida, a mais cinza a criticava por ter tido tanta liberdade ao manifestar sua feminilidade nos salões. Não era tão fácil a convivência entre elas, mas acabavam sempre juntas, até porque eram duas faces em uma mesma moeda.

A primeira era muito ética, solidária, amorosa, insegura e cautelosa. Tinha medo do que os outros falavam sobre ela. Assim, até onde a conheci, não conseguiu ser o que poderia ter sido.

Sabemos que a sociedade impõe padrões culturais desiguais para homens e para mulheres. São construções sociais difíceis de serem pensadas ou refletidas. Os papéis estão bem definidos e é comum esses papéis serem compartilhados e reforçados entre as famílias, mídia e outras células sociais. São arquétipos que vão se tornando verdades absolutas. Talvez por isso, as duas buscavam a si mesmas e não eram opositoras entre si, apenas cobravam, uma da outra, exercer o papel da mulher bem “comportada” na sociedade, enquanto viver intensamente sua singularidade era prioridade para a aquela que só queria ser mulher, na sua essência, sem pensar em exercer papéis definidos.

Nenhuma se sentia mais feliz do que a outra. Elas eram codependentes. Um dia, talvez, elas possam ser apenas uma delas, mas para isso terão que fazer uma escolha – qual das duas mulheres escolherão ser, pois até onde conheci, nenhuma abriu mão de ser o que é.

Fátima Gusso Rigoni

Fátima Gusso Rigoni

Mestre em Ciência da Educação; especialista em História e Filosofia da Ciência; especialista em Alfabetização e Letramento; e especialista em Ensino de Artes; Fátima Gusso Rigoni é graduada em Educação Artística; professora com experiência de trinta anos; palestrante; coordenadora e professora de cursos com formação continuada para professores e gestores; autora de livros didáticos e de conto; autora de projetos premiados voltados à Educação; e artista plástica.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Deixe seu comentário via Facebook