“O ‘zumbi’ Medanha”, por Werney Serafini
“Zumbi” é um morto-vivo que perambula no mundo dos vivos. Teve origem nas crenças africanas e rituais do vodu haitiano. Humano dado como morto que, sepultado, foi reanimado por forças misteriosas.
Animais também têm zumbis. A ciência relata espécies que vagam por jardins, parques e florestas. A metamorfose ocorre após infectados por fungos, vírus ou parasitas.
Um desses é a ‘formiga-zumbi’. Vítima do fungo Opphiocordyceps unilateralis, que ao penetrar no organismo dá início ao processo. Altera radicalmente o comportamento dela: o andar fica desordenado, em zigue-zague, tal qual um zumbi. Ao morder uma folha dá à chamada “mordida da morte”. Paralisada permite que o fungo se desenvolva numa haste fora da sua cabeça para depois espalhar os esporos.
Tem os “caranguejos-zumbis”. Uma craca conhecida por Sacculina ataca os animais de forma estranha. Ao encontrar a vítima, descarta mais de 90% do seu próprio corpo, reduzindo-se a um agrupamento de células que se ramificam no interior do hospedeiro. Depois de dominar o organismo do caranguejo, a craca femea abre um orifício para que o craca macho entre e se acasalem. Se o caranguejo for femea, o parasita faz com que carregue e distribua as larvas de Sacculina, pensando tratar-se dos seus próprios filhotes. Se for macho, provoca uma transformação surpreendente fazendo com que o caranguejo se comporte como femea.
Itapoá, também tem zumbi. Aqui é conhecido por Medanha. Não surgiu por causa de um fungo, vírus ou bactéria, como nos animais, mas de um predador, senão o maior, o mais daninho já visto no planeta: o homem.
Medanha foi um rio. Deixou, ou quase deixou de ser. Desagua no estuário formado pelas pedras de Itapema do Norte, o cartão-postal de Itapoá. Os antigos contam que sua água era limpa. Margens vegetadas protegiam o seu leito. Poucos em Itapoá o viram assim. Dizem que existiam peixes em suas águas. Seu azar foi estar num espaço privilegiado, o território que abriga a maior concentração populacional de Itapoá. Não teve escolha e muito menos defesa. Cedeu espaço para a cidade crescer. Suas margens foram desmatadas, drenadas e loteadas. O leito, desviado, manilhado e aterrado em muitos trechos. Tudo desmesuradamente, sem maior critério ou cuidado, ao sabor de interesses pontuais. Transformou-se num esgoto a céu aberto, recebendo dejetos dos mais variados. Seu mau cheiro, muitas vezes, era sentido na principal avenida da cidade.
Medanha é uma triste realidade, um “zumbi” que habita Itapoá. Rio que não é mais rio, morto-vivo que incomoda muita gente. Deveria servir de alerta, para que não surjam outros rios-zumbis, como o Palmeiras na iminência de ser. Para não acontecer o que seria uma irreparável tragédia, a “zumbificação” do Saí-Mirim.
Há 10 anos, rabisquei este artigo e ainda me pergunto: por quanto tempo o Medanha vai assombrar Itapoá?
Itapoá (Outono), maio de 2024.
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Parabéns Werney, pelo belíssimo e oportuno artigo: ” O ‘zumbi’ Medanha.
Infelizmente a triste situação não é apenas “privilégio” de Itapoá.
Aqui mesmo em Concórdia, SC, onde moro, temos o RIo dos Queimados nesta mesma e triste situação.
Vários rios da Europa foram totalmente recuperados e voltaram ao brilho de antanho.
Sugiro que você, a ADEA e a nossa modesta colaboração, possamos, juntos, desencadear um movimento para a “revivificação” do Medanha!
Aguardamos a feliz oportunidade de revê-lo com alegria e saúde!
Abraços, Bernardo Augusto Gunther, http://www.clinicagunther, Concórdia, SC