“Ressureição das florestas”, por Werney Serafini
Segundo o biólogo Fernando Reinach, autor do livro “A longa marcha dos grilos canibais e outras crônicas sobre a vida no planeta Terra”, as pessoas costumam associar a destruição de uma floresta com a morte de um ser vivo e, considerando que seres vivos não ressuscitam, supõem que áreas desflorestadas e degradadas não se recuperam jamais. Na verdade, um sofisma, ou seja, parece, mas não é.
A afirmação é compreensível, uma vez que um humano dificilmente ultrapassará os cem anos de vida. No entanto, se esse humano vivesse algumas centenas ou milhares de anos, saberia que a Floresta Amazônica ou a Floresta Atlântica encolheu, desapareceu, morreu e renasceu por diversas vezes.
Exemplo real é a ilha Krakatoa, onde as florestas e a vida foram extintas e depois ressuscitadas. Em 1883, a erupção do vulcão Anak Krakatoa entre Sumatra e Java, fez com que grande parte da ilha desaparecesse. O tsunami causado pela erupção fez com que a sua cratera submergisse no oceano. Quase 60 anos depois, a lava acumulada fez com que ela ressurgisse na superfície do mar. A ilha sumiu e reapareceu três vezes entre 1927 e 1930. Atualmente, está com mais de trezentos metros de altura e o vulcão Anak Krakatoa com mais de quatro quilômetros quadrados de extensão.
Após o ressurgimento da ilha e a lava resfriada, a vida começou a recolonizar a rocha vulcânica recém formada. Alguns meses depois, apareceram os primeiros fungos e micro-organismos. Em uma década, algumas áreas estavam cobertas por vegetação rala, predominando a cana-de-açúcar, planta nativa da região. Na sequência vieram os insetos, depois as aves trazendo sementes de espécies não transportadas pelo mar. Surgiram as primeiras florestas que atraíram mais pássaros e morcegos. Num censo, realizado em 1980, foram identificadas mais de 140 espécies de plantas, 40 de pássaros e centenas de insetos, a biodiversidade continuou a aumentar ano após ano.
A história da ilha Krakatoa demostra como a vida é resiliente e pode colonizar ambientes anteriormente devastados. Implica em processo longo e complexo, dependente da existência de seres vivos em locais próximos.
Fenômenos dessa natureza corrigem a nossa visão temporal e demonstram que a comparação de ecossistemas com a vida de seres vivos pode levar a conclusões equivocadas. Florestas ressuscitam e contrapõem a concepção usual de que regiões desmatadas devam ser liberadas para outros usos que não o florestal, uma vez que a regeneração seria praticamente impossível. Ledo engano.
Uma analogia pode ser feita em relação as matas ciliares dos rios em Itapoá, especialmente no rio Saí Mirim, manancial de abastecimento d’agua da cidade. Extensos trechos do rio foram desflorestados, e se fossem segregados, conservados e fiscalizados, poderiam proporcionar naturalmente uma rápida recomposição da vegetação protetora das suas margens, a custos mínimos para o Município.
Considerando que essas áreas, desprovidas da vegetação natural, permaneceram abandonadas, foram infestadas por brachiarias, gramínea exótica, de origem africana, invasora e agressiva, que prolifera descontroladamente assoreando trechos expressivos do rio. Podem comprometer a captação de água para a cidade, além de favorecer enchentes e inundações em épocas de chuvas intensas como as ocorridas recentemente. O que poderia ser mitigado com a recomposição da mata ciliar, e não através de vultuosos investimentos para o desassoreamento do Saí Mirim.
Como diz o ditado: “antes tarde do que nunca”.
Itapoá (outono), abril de 2024.
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