
“A visão do paraíso”, por Werney Serafini

“No princípio, eram os indígenas, as antas, as onças, os micos, os inhambus, os tucanos, as araras, os pindós, os ibirapitangas, os jequitibás, os urucuzeiros, os tarumãs, o ar limpo e, quando não chovia, o céu muito azul. O silêncio das matas tem muito ruído. Um pio comprido aqui, uma bater de asas ali, um galho que cai mais adiante, o zumbido dos insetos e, por toda a parte, fontes murmurantes, vento assobiando e, de repente, o estrondo do trovão. Essa era a terra desejada: Pindorama, em tupi-guarani, terra das palmeiras”. Assim narrou o professor Zé Pedro de Oliveira Costa, no capítulo primeiro do seu livro “Uma história das florestas brasileiras”, recentemente editado.
Cerca de cinco milhões de índios habitavam o Brasil antes da chegada dos “descobridores”. Tinham costumes, línguas e organização própria. Viviam da caça, da pesca, da raiz da mandioca cultivada nas “coivaras”. Sobreviviam do que a natureza proporcionava e, como não eram muitos em relação ao território ocupado, não causavam grandes impactos, a ponto de causar desequilíbrios ambientais significativos. Suas atividades eram de subsistência, semelhantes às das demais espécies de animais.
Ao chegarem, portugueses e espanhóis acreditaram terem descoberto o Paraíso. A natureza exuberante, o clima ameno, a nudez dos índios, as árvores e os frutos saborosos, os pássaros coloridos e seus cantos, foram irresistíveis aos europeus acostumados aos rigores do clima em seus locais de origem. O deslumbramento causado levava a uma conotação paradisíaca fazendo crer que estivessem mesmo no Paraiso terrestre.
Segundo o professor Zé Pedro, a flora tropical contribuiu para essa visão mística e a predisposição para encontrar o Paraiso idealizado pelos europeus fez com que vissem e ouvissem o que mais se adaptava a essa vontade fantasiosa: borboletas que se transformavam em beija-flores e outros acontecimentos maravilhosos. Os papagaios eram tidos como aves paradisíacas dada a beleza das suas penas e ao fato de imitarem a voz humana. Seriam descendentes dos anjos. De todo imaginário da época, uma conjectura mostrou-se real: a nova terra era infinitamente grande. O novo continente e as novas descobertas ampliavam o horizonte, limitando a Europa ao seu tamanho relativo.
Para Charles Darwin, “a Terra parece ter derramado toda a sua riqueza de cores e formas com as flores e também com os animais, em particular com os pássaros, as borboletas e outros insetos, que em grande quantidade dão vida às fragrantes florestas de plantas. Sim! É no Brasil, e em nenhum outro país, onde se encontra aquele paraíso ocidental, lugar de esperanças de nossa terra, com a qual sonhávamos já em tempos remotos”.
Assim era o Brasil, assim era Santa Catarina e assim era Itapoá: o paraíso terrestre. Tal qual os portugueses e espanhóis, as pessoas que aqui aportam atualmente são contagiadas por esse encantamento e dizem que Itapoá é parte do Paraiso. Que essa visão permaneça e se transforme em realidade para todos e não no Paraíso Perdido.
Itapoá (Primavera), outubro de 2023.
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Werney Serafini é presidente da Adea – Associação de Defesa e Educação Ambiental. Acredita no desenvolvimento de Itapoá com a observância de critérios ambientalmente adequados.
Luiz Roberto Imparato
Parabéns meu amigo pela atuação em prol do meio ambiente e por esse texto que demonstra seu estado de espírito!
Um grande abraço!
1 comentário