“Valor Agregado”, por Mutti Kirinus

É muito comum medir o valor de um produto ou uma ação pelo seu valor comercial. Muitas vezes essa perspectiva é até necessária, pois a manutenção deste produto vai depender da condição dele se auto sustentar. Também não se pode negar ou fugir da condição de estarmos vivendo dentro de um sistema econômico capitalista.

No entanto, para além do valor comercial para cada produto existem outros valores agregados que qualquer pessoa pode reconhecer, salvo se estiver sob um estado patológico, ou hipnótico de alienação de si mesmo ou do seu entorno.

Dentro do segmento dos produtos culturais, esse valor agregado e o valor comercial são muitas vezes inversamente proporcionais. Pensemos que o valor comercial de um produto passa pela equação da diferença entre despesa e receita, investimento e retorno.

Um maestro, amigo meu desabafou certo dia dizendo, ‘sabe Helmuth o meu instrumento é muito caro’. De fato, uma orquestra precisa de no mínimo uns 15 músicos de profissionais de excelência, assim, sem contar com som, palco e luz, só com um cachê mediano de 500 reais, uma apresentação já sairia de começo 7.500 reais, sem contar também a remuneração do próprio maestro que não faz música por hobby. Ao mesmo tempo, o público da música erudita é menor do que outros produtos mais comerciais da música. Desse modo, pela equação da diferença entre investimento e receita, as orquestras estariam em processo de extinção.

E a sua situação não é muito diferente disso, não fossem as leis de incentivo a cultura, municipais, estaduais e principalmente a federal, a lei Rouanet, que mantém 90% das orquestras no Brasil.

Mas nem é preciso ir tão longe, qualquer grupo musical que tenha pelo menos 5 componentes, vai enfrentar um problema semelhante na conta investimento e receita. Se este grupo for de música instrumental, por exemplo, que tem um público mais seleto, sua tendência é também a extinção, não fosse é claro a iniciativa e luta dos músicos que sabem o valor agregado que estes produtos possuem e não abrem mão de preservar a todo custo sua existência.

Não é preciso dizer que o valor agregado de uma orquestra, de um grupo de Jazz, de um regional de choro, de uma bateria de bloco carnavalesco, de um fandango, de manifestações de Maracatu, Côco, danças dos mais diversos gêneros, capoeira, etc. estão na manutenção da nossa história, que é a história da música, das artes, e que é a história da nossa humanidade.

Fica então a pergunta, se essas manifestações além de ter um valor agregado evidente, necessitam do auxílio para cobrir a defasagem no seu valor comercial, oriunda de diversos motivos, qual o sentido de investir dinheiro público em um produto que já possui um valor comercial e pode se manter sozinho, e deixar morrer de fome essas outras manifestações?

Mutti

Mutti

Helmuth A. Kirinus é mestre em Filosofia pela UFPR, formado em gestão cultural e músico. Atualmente coordena 8 projetos via lei Rouanet de incentivo à cultura e 4 via Sistema Municipal de Desenvolvimento da Cultura de Joinville. É professor de violão e coordenador da Escola de Música Tocando em Frente em Itapoá. Atua também como representante técnico do setor Comunicação e Cultura dos projetos do Ampliar pelo Porto Itapoá.

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