
“Além do discurso”, por Werney Serafini

Não sei quantas vezes escrevi esse artigo. No entanto, penso não ser demais relembrar o fundamento da “Teoria das Janelas Quebradas”, concebida pelo cientista político James Q. Wilson e o psicólogo criminalista George Kelling.
Segundo eles, um prédio descuidado, com vidros quebrados e sinais de abandono, inevitavelmente será vandalizado. Por analogia, uma cidade, bairro, praça ou equipamento público, com sinais de descuido e desleixo por parte dos moradores e da administração pública, servirá de cenário para os mais diversos delitos. O descaso fará com que sejam ocupados por desordeiros e se transformem em terra de ninguém. Os moradores tradicionais serão afugentados, os comerciantes desistirão do lugar, o tráfico de drogas se instalará e o Estado deixará de prestar serviços básicos para a população. A polícia será hostilizada, água e luz ligadas clandestinamente, muros e paredes pichados e os imóveis desvalorizados. Crianças e jovens convivendo com a marginalidade estarão propensos a se transformarem em futuros contraventores.
A relação entre desordem e criminalidade é mais forte que a relação entre criminalidade e pobreza. Qualquer patrimônio, visivelmente abandonado, atrai o vandalismo e a violência.
Assim foi em Nova York na década de 80 e início dos anos 90. Desordeiros e marginais dominavam os espaços públicos, as praças, parques e estações do metrô. Prédios pichados predominavam na paisagem urbana e gangues agiam livremente. As ruas passaram a ser evitadas por residentes e turistas.
Rudolph Giuliani, eleito prefeito, elaborou um plano denominado “Cidade limpa e segura”, firmando parcerias em troca de benefícios fiscais. Na segurança instituiu o programa “Tolerância Zero”, punindo radicalmente os pequenos delitos, antes que a impunidade estimulasse as faltas mais graves. Com a adoção de medidas concretas, a cidade de Nova York mudou em pouco tempo.
A desordem urbana está no comércio irregular, nas pessoas em situação de vulnerabilidade, na falta ou deficiência de iluminação pública, na ineficiente coleta de lixo, nos terrenos e imóveis abandonados e invadidos, no descumprimento das leis de transito, na perturbação do sossego e da ordem pública, nas ocupações e nas construções irregulares, na degradação ambiental, no descaso com a mobilidade urbana e, em resumo, no desleixo com a cidade.
Qualquer espaço público, – escola, praça ou local de convivência – descuidado, sujo e sem iluminação, além de evitado será atrativo para a prática de delitos. Ao contrário, o mesmo espaço, cuidado, iluminado, sem pontos de vulnerabilidade, com os equipamentos urbanos conservados e em funcionamento, inibirá a presença de delinquentes.
Por essa razão, em termos de segurança, mesmo sem a presença maciça de agentes policiais, a administração municipal pode contribuir significativamente para a minimização dos índices de violência. À administração municipal, cabe ações de prevenção para a segurança da cidade. À polícia, compete a repressão qualificada.
O permanente cuidado com a cidade e a revitalização dos espaços degradados é condição básica para o bem estar da população e do desenvolvimento da sociedade.
A população deve colaborar e apoiar os órgãos de segurança, mas fundamentalmente são ações concretas da gestão pública que farão a diferença na cidade.
A insegurança extrapola o discurso.
Itapoá (inverno), julho de 2022.
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Werney Serafini é presidente da Adea – Associação de Defesa e Educação Ambiental. Acredita no desenvolvimento de Itapoá com a observância de critérios ambientalmente adequados.
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