O doutor em Conservação da Vida Silvestre, Silvio Marchini, ensina que o comportamento do homem em relação a floresta foi moldado pela evolução, assim “cada espécie animal tem o ambiente preferido, onde suas adaptações lhe permitem prosperar”.
Segundo a teoria da “Hipótese da Savana”, os ancestrais humanos viveram nas planícies da África e desenvolveram a preferência pelas paisagens abertas, onde era mais fácil caçar os animais de grande porte, essa inata preferência estaria presente no homem moderno. No livro “Armas, Germes e Aço”, Jared Diamond, diz que “o estilo de vida coletor/caçador dos povos das florestas proporcionava dieta pobre em energia e que, por viverem em pequenos grupos, seriam incapazes de desenvolver a agricultura e a criação de animais, tecnologias que fizeram surgir as civilizações”. Haveria, portanto, um fundamento biológico para o comportamento humano em evitar a floresta, e esse impulso ancestral talvez fosse a base para a relação predatória com ela, explica Marchini.
Outra teoria, da “Hipótese da Biofilia”, defende que a evolução teria selecionado no homem um sentimento de afinidade com os demais seres vivos e isso levou os ancestrais humanos a entender os riscos e oportunidades do ambiente natural, contribuindo assim para a sua sobrevivência. No dizer de Marchini, “a quinta-essência da diversidade e sofisticação no mundo vivo é encontrada na floresta tropical e, portanto, esse tipo de ambiente exerceria em nós uma atração instintiva especial”.
A par dessas teorias e em concordância com a maioria dos pesquisadores, concluiu Marchini que as variações no comportamento humano resultam daquilo que se aprende, e seriam os conhecimentos e as crenças que determinariam nossas ações.
Os indígenas e as populações tradicionais acumularam profundo conhecimento sobre os recursos advindos das florestas, o que os permitiu utilizá-las sem destruí-las. Situação inversa à dos migrantes na fronteira agrícola da Amazônia, por exemplo, em que agricultores provenientes de regiões onde já não existiam mais florestas, para sobreviverem teriam que transformar a mata em campos de agricultura.
Analogamente, poderiam as categorias populacionais de Itapoá, ilustrativamente, classificadas como: “nativos”, os pescadores tradicionais; “forasteiros”, migrantes de outras regiões e com domicilio fixo na cidade; “veranistas”, turistas de temporada e/ou ocasionais; e, mais recentes “novos forasteiros”, trabalhadores portuários.
O “nativo”, originário de Itapoá, vive ou vivia da pesca, fazendo uso do recurso com mínimo impacto no ambiente. O pescador artesanal pouco degradava a floresta, limitando-se a utilizar o tronco de determinadas espécies de árvores para construir sua canoa. Praticava uma agricultura de subsistência com roçados de mandioca, banana, a criação e caça de pequenos animais para complementar a alimentação.
O “forasteiro”, chegou a Itapoá para exercer atividades no comércio e na prestação de serviços na temporada de verão, ou na construção civil e no mercado imobiliário. Para a maioria deles, a floresta e a vegetação nativa é considerada “mato” e como tal deveria ser eliminada, as árvores suprimidas para dar lugar as construções.
O “veranista”, visitante ocasional em busca de sol e mar, desprovido de maior comprometimento com Itapoá, além do lazer e descanso. A maioria desconhece a floresta e seus atrativos. Na curta temporada multiplicam por dez a lotação da cidade causando grandes impactos ambientais.
Os “novos forasteiros”, pessoas envolvidas nas atividades do terminal portuário implantado no município e dos empreendimentos instalados na área retroportuária, interessados nas oportunidades geradas pelo crescimento econômico de Itapoá, muitos deles, indiferentes as árvores e florestas.
As ações humanas não são guiadas somente pela racionalidade dos conhecimentos e crenças, são movidas também por emoções. O medo de cobras, aranhas e outros animais peçonhentos explicam em parte a ausência de vegetação nativa nas proximidades das habitações. No entanto, o homem, por gostar de animais, plantas e paisagens naturais ainda conserva algumas florestas. As Unidades de Conservação, públicas ou privadas, são criadas levando-se em consideração diversos critérios, entre eles, a beleza cênica, pois a estética é fenômeno afetivo. Diz Marchini, que “a falta de emoção, por sua vez, resulta na indiferença”. Por outro lado, as pessoas tendem a fazer aquilo que acreditam que os “outros” fazem e, “se todo mundo desmata, então desmatar é certo, e eu também vou desmatar”.
Porém, numa visão otimista, a modernização da sociedade é seguida por uma mudança de valores em relação a natureza e as florestas passam a ter importância pela biodiversidade, serviços ambientais e os produtos de natureza gerados. Vista pejorativamente como “mato” adquire imagem de lugar útil, importante e atraente, que merece ser visitado e cuidado. Itapoá (Inverno), julho de 2020.