Entre os mais afetados pela pandemia, segmento cultural aguarda o repasse de recursos aprovados

De acordo com Helmuth (Mutti) Kirinus, gestor cultural e responsável pela Escola de Música Tocando em Frente, que desenvolve diversos projetos culturais em Itapoá, a situação do isolamento não favorece e, pelo contrário, atrapalha bastante o trabalho com a cultura, já que a troca de conhecimentos e expressividades acontecem melhor presencialmente.

Rafael Daniel Huch, maestro com atuação em diversos projetos de Joinville e Itapoá, cita que a área da Cultura foi a primeira a ser atingida e sofrer os impactos do coronavírus. “E certamente, será a última também a retornar suas atividades de forma plena”, acredita ele. Ainda de acordo com Rafael, várias foram as adaptações da Cultura para as plataformas online, mas elas não abrangem todas as possibilidades e tampouco são tão efetivas quanto os encontros presenciais. “Por exemplo, eu tenho um violino em uma casa e um segundo em uma outra. Quando a gente vai tocar em conjunto, há um ‘delay’ [uma demora]. Isso acontece quando você faz algo em conjunto. Nós temos feito aqueles vídeos com as pessoas nas janelinhas, tanto de orquestra quanto de coral, que é uma alternativa, mas não é o ideal”, exemplifica ao citar os vídeos que são gravados individualmente e não de forma simultânea como seria o ideal. Essa dificuldade se dá pela inexistência de softwares que evitem esse ‘delay’, apesar das inúmeras novas tecnologias que ajudam muito, mas não substituem o trabalho presencial. O maestro ainda comenta que, de forma geral, os músicos têm sentido demais o impacto da pandemia, porque além de ensaiarem e tocarem em grupos, eles fazem eventos, casamentos, cerimônias, e tudo isso está cancelado por força de decreto.

No último dia 30 de junho, foi publicada, no Diário Oficial da União, a Lei nº 14.017 de 2020, apelidada de “Lei Adir Blanc”, em homenagem ao compositor carioca que faleceu no início de maio, vítima da covid-19. Por meio dela, o Governo Federal libera R$ 3 bilhões em auxílio financeiro a artistas e estabelecimentos culturais durante a pandemia de covid-19. Esses recursos estão sendo repassados a estados, Distrito Federal e municípios, que devem aplica-los em renda emergencial para os trabalhadores do Setor, subsídios para manutenção dos espaços culturais e instrumentos como editais e prêmios.

Mutti Kirinus avalia a lei federal recém-publicada com bastante otimismo.  “Acredito que a cultura deva ser uma prioridade nestes tempos de pandemia. Ela pode trazer alento e promover a reestruturação da sociedade durante e após a pandemia”, considera.

Para Rafael Huch, auxílios são muito bem-vindos, mas há uma preocupação com relação aos prazos para o cumprimento de critérios à utilização deles. “Também a nível federal, teremos recursos que virão para os estados e cidades, e algo que me preocupa com relação a isso é porque há 60 dias para se cumprir e vem uma boa quantidade de dinheiro. Será que as cidades estão preparadas para lançar um edital, por exemplo, emergencial, com esses recursos. Essa é uma pergunta que me faço, porque tem cidades que não têm nem um conselho de cultura ativo, que possa estar intermediando nesse sentido, e isso é preocupante. O recurso vem, mas se não for utilizado, ele volta”, explica o maestro.

Mutti e Rafael lembram que, na esfera estadual, está aberto, para inscrições, o Edital Elisabete Anderle 2020 de Estímulo à Cultura do estado de Santa Catarina. “Ano passado, já conseguimos trazer três prêmios para Itapoá. Este novo edital é uma oportunidade para os proponentes tentarem trazer recursos para a Cultura da cidade. Porém, é um edital bastante concorrido. São poucos prêmios para tantos municípios de cada mesorregião”, explica Mutti. Rafael complementa: “mesmo o Anderle, em meio a essa pandemia, não prevê em seu edital, apresentações online, por exemplo. Ele não cita isso e poderia já ter essa prerrogativa no próprio edital, dada a circunstância que estamos vivendo”.

De acordo com a secretária municipal de Turismo e Cultura de Itapoá, toda a equipe do Departamento de Cultura da Prefeitura – em especial, a diretora Neusa Lopes e a coordenadora de projetos Geane Saggioratto – está focada na implantação da Lei Adir Blanc, com o apoio da Amunesc (Associação de Municípios do Nordeste de Santa Catarina). “A equipe também está finalizando alguns projetos de lei relacionados à Cultura, que serão encaminhados para apreciação do Prefeito Municipal e, posteriormente, encaminhados para a Câmara de Vereadores. Destacamos, ainda, que estamos à disposição para receber nossos artistas e orientar na elaboração de projetos. Precisamos que a Cultura sobreviva independentemente do distanciamento social”, considera a secretária.

O gestor cultural Helmuth Kirinus comenta a importância de incentivos que partam do Município. “Na esfera municipal, deveriam ter também auxílios próprios, como a criação da lei municipal de incentivo à Cultura, que seria a solução para o Setor e foi promessa de campanha. Por enquanto, não vi nenhuma ação que amparasse diretamente os artistas, pelo menos no segmento musical, que estou mais próximo. A Lei Aldir Blanc é algo recente e, justamente por ser emergencial, deve ter uma aplicação o mais rápido possível. Sei que a secretária de Turismo e Cultura do Município está estudando a utilização do repasse federal pela lei Aldir Blanc”. Para ele, a valorização da cultura deve ser uma prioridade também neste momento, uma vez que traz benefícios econômicos e agrega valores fundamentais para a superação desta calamidade mundial. “Acho que esses investimentos deveriam acontecer sempre, independente de recursos estaduais e federais, a lei municipal de incentivo à Cultura seria uma solução. A Cultura ter uma pasta própria e independente, não atrelada ao Turismo, também traria benefícios ao Setor”, conclui Mutti.

O maestro Rafael Huch complementa que em relação às esferas municipais, considerando Itapoá e Joinville, onde ele atua, não está havendo amparo. “Pelo menos, se tiver, eu desconheço. Eu sei que em Joinville, nós temos um Conselho de Cultura, por exemplo, formado pela sociedade civil, que está conversando em alguns grupos sobre a Lei Adir Blanc, mas claro que não é a sociedade civil que vai definir isso. É o Poder Público que vai receber o recurso e vai verificar como viabilizar. Em Itapoá, nós não temos um Conselho de Cultura, então eu sei que o recurso vai chegar e, inclusive, existe uma tabela de estimativa de quanto os municípios vão receber, mas eu não ouvi ainda nada sobre para onde vai esse recurso, o que será feito com ele e assim por diante. Eu acho que algo que poderia ser feito de forma imediata é um edital emergencial. Se os músicos estão passando dificuldade e, de fato, estão, por que não abrir um auxílio, edital emergencial, pelo qual eles possam fazer apresentações online em duos ou trios e jogar na internet, por exemplo? Porque eu entendo que essas leis que vieram, como a Adir Blanc, são justamente para isso de emergencialmente colaborar para que a Cultura não morra, para que esses profissionais não deixem de fazer cultura. Imagina perdemos [para outros segmentos] os poucos profissionais de Cultura que nós temos. Isso para a sociedade é muito ruim”, considera Rafael.

A secretária municipal de Turismo e Cultura de Itapoá, Angela Puerari, explica que, tal como em relação ao segmento do Turismo, todas as ações da Cultura no Município foram repensadas neste momento de pandemia. Segundo ela, toda a equipe da Secretaria tem atuado em projetos de resgate histórico-cultural que serão apresentados em breve. “Estamos trabalhando em parceria com vários órgãos relacionados à Cultura em nível regional, estadual e nacional, a fim de unificar as ações e trocar experiências para que possamos dar à Cultura de Itapoá o retorno que merece no menor tempo possível”, conclui.

FOTO: Marcelo Camargo / Agência Brasil / Arquivo.

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Thiagão

Jornalista pela PUC/PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná) com pós-graduação em Marketing Empresarial pela UFPR (Universidade Federal do Paraná), Thiago Gusso já trabalhou em importantes projetos de comunicação de Curitiba (PR) e Itapoá. Atualmente, responde pela Direção do site Tribuna de Itapoá e do jornal impresso Itapoá Notícias, nos quais segue também em sua atuação como jornalista. E-mail: thiago@itapoanoticias.com

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