“Cadê a onça?”, por Werney Serafini

Você sabia que em Itapoá existiam onças? Já deve ter ouvido falar do Caminho da Onça, não?

Contam, antigos moradores, que o caminho da onça era uma picada no meio do mato, entre o mar e o rio Saí-Mirim. Por ela passava o maior predador da fauna brasileira, hoje na lista dos animais quase ameaçados de extinção. A Onça Pintada (Phantera onca), da ordem dos carnívoros, membro da família dos felídeos e um dos mais fantásticos animais da fauna brasileira. Isso, quando Itapoá nada mais era que uma vasta extensão de Floresta Atlântica na planície costeira. E não faz muito tempo, coisa de cinquenta, sessenta ou setenta anos.

A picada não existe mais. No lugar, uma via pública, tipo “rodovia urbana”, fazendo a ligação entre importantes bairros da Cidade. No entanto, a população, senão todos, a maioria ainda chama de Caminho da Onça.

Da onça, não se sabe. Mataram, migrou ou fugiu para longe, na floresta que restou do seu habitat. Mateiros experientes, como o seu Hercílio Souza, contam que ela, de vez em quando, dá o ar da graça em repentinas aparições. Comprovadamente, sabe-se apenas da existência de um parente próximo, a Onça Parda (Puma concolor), flagrada por sensores das máquinas fotográficas dos pesquisadores na Reserva Volta Velha.

O caminho, por força de Lei Municipal, trocou de nome, passou a se chamar Avenida Zilda Arns. A onça perdeu o caminho; a cidade, parte da memória.

Mas a história da onça permanece. Ainda hoje é comum perguntarem na Reserva Volta Velha, se existe onça pintada nas matas preservadas do local. Infelizmente, a resposta é negativa, e a explicação, por sua obviedade, triste e preocupante.

Fernando Fernandez, biólogo, PhD em Ecologia pela Universidade de Durhan (Inglaterra) e professor do Departamento de Ecologia da UFRJ, ensina que as onças são animais grandes e se alimentam de presas grandes, não mais tão comuns na Mata Atlântica. Uma onça, explica, precisa de território muito extenso para caçar, procriar e sobreviver. Esse território, também, não pode se sobrepor com os de outras onças, pois são animais territorialistas.

Cita que no Parque Iguaçu, no Paraná, existiam até recentemente, cerca de 150 onças em uma área de 1.850 km², uma densidade populacional aproximada de uma onça para doze quilômetros quadrados, ou seja, 1.200 hectares. Na Floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro, que tem pouco mais de 3.000 hectares não caberiam os territórios de três onças e isso ocorre na maioria dos fragmentos florestais remanescentes na Mata Atlântica do Brasil. Portanto, não é de se estranhar a ausência de onças pintadas na Floresta da Tijuca e, por analogia, nas florestas das duas unidades de conservação da Reserva Volta Velha, que juntas somam perto de 1.000 hectares contínuos de áreas protegidas. Isso explica, também, o porquê da espécie estar numa situação crítica no Brasil.

Para o professor, há duas maneiras de matar uma onça. A primeira, rápida e direta, pode ser a tiros ou com iscas envenenadas. A segunda, mais sutil, é destruindo o seu habitat, preservando apenas um remanescente da floresta, menor do que a área que uma população de onças precisaria para sobreviver. As duas maneiras são eficientes; a segunda é apenas um pouco mais lenta.

Não saberia dizer, de que forma as onças de Itapoá foram eliminadas, mas arrisco um palpite: provavelmente das duas maneiras.

Itapoá, outono de 2019.

Avatar

Werney

Werney Serafini é presidente da Adea – Associação de Defesa e Educação Ambiental. Acredita no desenvolvimento de Itapoá com a observância de critérios ambientalmente adequados.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Deixe seu comentário via Facebook